O Fórum da Verdade dedicado ao tema “Agricultura: oportunidade, identidade, coesão social” decorreu em Rio Maior, a 18 de Maio, com uma elevada participação e com os trabalhos moderados por Henrique Granadeiro gestor mas também ele próprio agricultor.
Na sessão Henrique Granadeiro deixou dois apelos: que as eleições legislativas e autárquicas se realizem em simultâneo, e que haja uma verdadeira avaliação do “Estado da Nação”, lamentando a ausência de um orçamento rectificativo que permita ter uma “visão global” da verdadeira situação do País.
A escolha de Rio Maior e da agricultura para o último Fórum Portugal de Verdade foi uma forma de o PSD mostrar que este sector não é “o parente pobre da nossa economia”.
João Machado: “Houve uma devolução de verbas a Bruxelas de tal maneira inacreditável que nos últimos três anos foram desperdiçados centenas de milhões de euros de ajudas, algumas totalmente do orçamento comunitário”O presidente da CAP, João Machado, referiu que Henrique Granadeiro, o moderador deste Fórum “sabe quase tanto como nós deste sector pois é um agricultor exímio”.
O primeiro orador do Fórum da Verdade adianta do que “a agricultura devia ser a identidade de um povo, um conjunto de oportunidades para os agricultores mas, também, para o mundo rural e para aqueles que trabalham na agricultura, bem como para os que podem desfrutar do campo tratado e dos produtos que a agricultura produz”.
João Machado frisou, igualmente, que a agricultura promove a coesão nacional. “ O território português sem a agricultura não tem coesão” disse, lembrando que cerca de 80 % do mesmo está ocupado ou por terrenos agrícolas ou florestais.
Para o presidente da CAP “ se não houver esta actividade principal que é a que liga as populações à terra e as fixa, nenhuma outra actividade económica o fará, e teremos um país ainda mais inclinado para o Mar do que hoje temos, bem como cada vez mais desertificado no Interior”.
João Machado adverte que “a agricultura devia ser olhada tendo em vista esse contributo especial, não só por produzir alimentos que são uma reserva estratégica indispensável para qualquer Estado soberano sobreviver, mas uma actividade que ocupa mão-de-obra”. Realçou, ainda, factores como o da protecção do Ambiente que é promovida pelos agricultores e a questão da prevenção dos fogos florestais.
O orador lembrou que os fogos florestais são provocados em boa medida por não haver agricultura e, consequentemente, o campo estar despovoado. João Machado realçou, ainda, o turismo e os produtos regionais como factor de promoção económica que levam ao reforço da coesão nacional.
Dessa forma considerou “ que a agricultura devia ser olhado pela sociedade e pelos políticos como um factor fundamental para o desenvolvimento do país”.
O presidente da CAP referiu que “desde 1986 que temos em Portugal a PAC – que não pedimos e que não desejámos até porque veio impor regras muito duras – mas hoje temos de viver com ela. E os agricultores são confrontados com a PAC todos os dias.
Por isso dizemos que a PAC é um direitos dos agricultores europeus, mas um dever dos governantes de a disponibilizarem para os seus agricultores. É assim em toda a Europa e também em Portugal” disse, adiantando que “quando as regras mudarem estamos também dispostos a mudar de paradigma”.
PAC não favorece PortugalNeste momento a PAC não favorece Portugal e nos sete anos deste último quadro comunitário representou fundos de cerca de 4400 milhões de euros de investimento e pagamentos directos os agricultores de mais de 600 milhões de euros por ano, que poderiam ter ajudado o desenvolvimento do país, designadamente em momentos de crise económica.
O presidente da CAP fez uma apreciação muito negativa do que foi a aplicação da PAC a Portugal nestes últimos anos, frisando que em 2005, quando o actual governo socialista tomou posse, as candidaturas foram fechadas e nunca mais foram reabertas excepto durante quinze dias de Abril de 2009. Portanto, refere que “ as verbas do QCA anterior foram desperdiçadas enquanto o PRODER, o novo quadro comunitário devia estar em vigor desde 2007 e ainda hoje em 2009 os agricultores não têm acesso ao mesmo”.
Denuncia que o PRODER “ tem 18 medidas mas metade das quais não está regulamentada enquanto a outra metade não está disponível em termos de candidaturas. E mesmo a parte que está disponível em termos de candidaturas não está em execução, pelo que os agricultores ficam sem essas verbas para investimento. Nos últimos anos temos assim um quadro negro em termos de investimento e estamos a falar de verbas de 850 milhões de euros que não foram investidos nos dois primeiros anos do novo quadro comunitário de apoio”.
João Machado disse que “já todos nós já ouvimos o primeiro-ministro José Sócrates a prometer 1000 milhões de euros de investimentos para agricultura, primeiro para Novembro e depois para datas sucessivamente adiadas” frisando João Machado sentir-se “ofendido por este anúncio repetido, e pelos prazos sempre dilatados e nunca cumpridos”.
Para além disso, o orador refere que “ parece que o governo está a dar 1000 milhões de euros, o que é um dado errado, pois estes carecem de candidaturas e 700 milhões dependem dos agricultores sendo mesmo investimento privado, quando só 60 milhões é que são contribuição do Estado português”.
Criticou, ainda, o facto das medidas agro-ambientais terem sido suspensas em 2005, dizendo que “mal o executivo tomou posse parou tudo. Em 2005 tínhamos 85 mil agricultores candidatos às medidas agro-ambientais e hoje temos apenas 13 mil agricultores”, acrescentou.
João Machado acusou o ministro da Agricultura, Jaime Silva, de apesar de ter tido todas as condições, “nada ter feito, limitando-se a governar contra os agricultores, as suas organizações, e até contra os funcionários do Ministério”.
No seu entender, nesta legislatura, o Ministério da Agricultura foi destruído, gerando um “ desnorte total em todo o sector”. Além disso, acusou, “ houve uma devolução de verbas a Bruxelas de tal maneira inacreditável que nos últimos três anos foram desperdiçados centenas de milhões de euros de ajudas, algumas totalmente do orçamento comunitário”.
João Machado realçou que a reforma da Política Agrícola Comum que se vai iniciar em 2009 é fundamental, mas o futuro da agricultura portuguesa exige “uma reforma do ministro e deste Governo”, o qual acusou globalmente de promover um conjunto de medidas, a nível da educação e da saúde, que promovem a desertificação do país.
Firmino Cordeiro: “ As medidas do PRODER, muitas das quais ao fim de 29 meses ainda nem sequer estão em prática, foram criadas para um País que não é o nosso”Segundo orador neste Fórum da Verdade Firmino Cordeiro, presidente da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP) considerou ter a vida facilitada por falar depois da intervenção do presidente da CAP.
Revelou ter estruturado a sua intervenção para falar de vários pontos, designadamente para frisar a “insensibilidade do governo ao longo destes quatros anos em relação à agricultura. Pensamos que é terrível ouvir o Ministro da Agricultura dizer “ que não há crise, pois para os agricultores não é fácil abandonar as suas explorações pois não sabem o que fazer aos animais, às vinhas ou às explorações, ou seja às infra-estruturas físicas que tiveram de desenvolver muitas vezes ao longo dos anos e com grandes problemas com a banca para se financiarem”.
A instalação de um jovem agricultor envolve muitos investimentos e ainda hoje os agricultores portugueses são dos mais envelhecidos da Europa com uma produtividade que é das mais baixas da Europa. Factores que se percebem “quando a superfície irrigada não é regada em cerca de um terço, e cerca de 56 % dos agricultores mantêm a actividade por motivos afectivos” referiu Firmino Cordeiro adiantando alguns dados negativos sobre o sector para dizer “ que estes deviam ter sido combatidos ao longo de uma legislatura facilitada pela maioria política e por programas que ainda vinham do anterior quadro comunitário anterior e que cessaram com este executivo do PS”.
Uma situação de paralisia que o presidente da AJAP qualificou de “trapalhadas sem sentido quando existe uma estabilidade governativa”.
Sobre o PRODER lembrou que se teve um período de vazio na transferência de um quadro comunitário para o outro frisando que “ mesmo ignorando as complicações do atraso este pouco vai resolver. As medidas do PRODER, muitas das quais não estão sequer em prática ao fim de 29 meses, foram criadas para um País que não é o nosso. Ao mundo rural profundo, adaptado e adaptável às exigências da UE em termos ambientais, foi retirado um dos seus principais apoios, as Medidas Agro-Ambientais”, lamenta. Adianta que “as actuais apenas mantêm o nome, mas são de tal forma exigentes que praticamente não se adaptam aos nossos agricultores”.
Organizações não foram ouvidasO presidente da AJAP frisou que em relação ao PRODER as organizações de agricultores quase não foram ouvidas.
Firmino Correia garantiu que estão disponíveis como sempre e, mais uma vez, e em nome da AJAP “ para mostrarem a sua vontade de se associarem a projectos de futuro, em prol da valorização da actividade, e do desenvolvimento de melhores condições de vida nas zonas rurais”.
“Refiro-me concretamente à implementação do prometido banco de terras, refiro-me ao desafio de instalar mais jovens na nossa agricultura, refiro-me à necessidade de dinamizar as zonas rurais e de fixar pessoas capazes de as desenvolver” adiantou o orador.Falando no Mundo Rural realçou “o abandono constante da agricultura que tem conduzido a uma forte redução demográfica para valores inferiores ao limite da viabilidade de muitas zonas de Portugal”. Segundo Firmino Cordeiro o abandono do território “ é um dos principais problemas com que actualmente o país se confronta, isto a par com o envelhecimento dos empresários agrícolas. Ou seja, face às dificuldades em vez de irem para a agricultura os jovens deixam as gerações anteriores permanecerem na actividade muitas vezes até ao final da vida”.
O presidente da AJAP refere que “ para que um local seja atraente para que um jovem se fixe é necessário que tenha qualidade de vida, sendo urgente tornar o Mundo Rural mais apetecível para o investimento e para se inverter a tendência do seu abandono”.
Para além desta questão tão relevante para os jovens agricultores Firmino Cordeiro adverte que “ não nos podemos esquecer do reconhecimento da multifuncionalidade da agricultura, e a valorização das virtualidades resultantes de uma actividade agrícola que proteja o ambiente, a biodiversidade e as paisagens rurais, o que será fundamental para a viabilidade das regiões portuguesas com elevada tendência para o abandono do território por parte das populações”.
Ainda sobre o rejuvenescimento do sector deixou claro que “é essencial para o desenvolvimento do País a existência de jovens agricultores a apostar na inovação e na criação de novos projectos no espaço rural e a contribuírem para a criação de emprego”.
Para isso sugere a criação de um grupo de medidas que impulsionem o que chama de “ jovens empresários rurais que para além da actividade agrícola passem a desempenhar outras tarefas mobilizadoras da sociedade local em actividades conexas com a agricultura”. Dessa forma, frisa, “fomentava-se o espírito empresarial e garantia-se um adequado nível de rendimento”.
Recorde-se que em matéria de jovens agricultores o quadro actual é negro, e estes representam hoje apenas 2,9 % dos agricultores existentes em Portugal quando a média comunitária é de 5,3 %.
Firmino Cordeiro lamentou a posição assumida pelo Ministério da Agricultura “ que baseou a sua acção na perseguição aos agricultores e às suas organizações sem dessa atitude nada resultar de benéfico para o país”. Assim se perdeu “ a oportunidade de rejuvenescer a actividade agrícola pois durante 3 anos não se teve um regime de apoio à primeira instalação, e quando finalmente este surgiu o PRODER pecou por inúmeras intenções e omissões sem que no terreno nada se concretize” denunciou.
Firmino Cordeiro terminou a sua intervenção no Fórum da Verdade deixando algumas sugestões face à campanha de descrédito de alguns agricultores que tem sido orquestrada pelo governo dizendo ser importante “ enaltecer o papel dos agricultores junto da sociedade e lembrou que os melhores parceiros destes são mesmo os consumidores “.
Defendeu, ainda uma urgente reprogramação do PRODER. “Deve alterar-se o seu modelo de gestão burocrática e centralizada do PRODER” disse, adiantando “ que a agricultura é um sector estratégico para coesão território pelo que se deve apostar na cooperação com as organizações agrícolas “.
Rosário Alves: “As associações de produtores florestais de certo modo tiveram de se substituir ao Estado, e têm vindo a fazer um esforço de registo das pequenas propriedades que predominam nas mãos dos cerca de 400 mil proprietários que se estima existirem no país”Rosário Alves Directora Associação Florestal de Portugal (Forestis) disse ter recebido o convite para participar nesta sessão do Fórum da Verdade quando se encontrava em Madrid “ e ao ver o fosso entre a situação que existe em Portugal e noutros países se viu na obrigação de contribuir para este debate”.
Trabalhando há 12 anos no sector florestal Rosário Alves considerou ” confrangedor o fraco desenvolvimento que se tem na floresta portuguesa face ao nosso elevado potencial”.
A especialista florestal optou ilustrar a sua intervenção com uma mostra de slides para revelar alguns dados relevantes sobre a floresta portuguesa, e desde logo para lembrar aos participantes que dois terços do território português estão ocupados por floresta que é uma componente importante de toda a nossa vida. Referiu que em Portugal se tem uma floresta mediterrânica bastante diversificada, e que representa para além das árvores um conjunto de oportunidades de prestação de serviços e de criação produtos.
Rosário Alves frisou que “somos dos países com maior biodiversidade da Europa”, Referiu que 97 % da nossa floresta é privada existindo 400 mil proprietários, e chamou a atenção para coexistirem zonas de minifúndio com outras propriedades de grande extensão, ambas com necessidades próprias de investimento.
A directora executiva da Forestis disse que ainda há muito por fazer no sector florestal, nomeadamente ao nível do cadastro das explorações e no inventário florestal, e que ainda não se tem encontrou um modelo de desenvolvimento que se adapte à realidade que existe em Portugal.
A técnica disse ainda que “têm sido as associações de produtores florestais de certo modo tiveram de se substituir ao Estado e têm vindo a fazer um esforço de registo das pequenas propriedades, que predominam nas mãos dos cerca de 400 mil proprietários que se estima existirem no país”.
Rosário Alves alertou os participantes no Fórum para os dois principais riscos das florestas, desde logo o dos incêndios florestais apesar de nos últimos três anos se ter por questões de clima, ou seja verões menos quentes, verificado algumas melhorias.
Outro problema que afecta a floresta é o das chamadas pragas adversas, designadamente a do Nemátodo da Madeira do Pinheiro (NMP) que em Portugal tem causado grandes prejuízos aos produtores e às indústrias. Mas muitas outras doenças que afectam a produtividade do país em termos florestais.
Rosário Alves defendeu a necessidade de se certificar todos os agentes das fileiras florestais, lembrando que se está num mercado internacional. Criticou que até ao momento o Governo considere “ que a certificação é um problema dos proprietários, e que eles é que o devem resolver o que coloca em risco fileiras importantes com ao do eucalipto, cortiça e pinheiro”.
Em termos de competitividade a técnica referiu que Portugal tem três vezes menos produção que a dos países tropicais, mas tem também três vezes mais do que a conseguida nos países escandinavos, pelo que a floresta é um relevante recurso para o país.
Rosário Alves pediu que os apoios que o Governo já disponibiliza à indústria também sejam estendidos aos produtores florestais, uma vez que todo o sector merece ser ajudado. “Dentro dessa lógica de incentivo, o Estado também deverá considerar importante um bom tratamento para os produtores florestais porque são estes que mantêm a floresta portuguesa de uma forma sustentável” explicou.
A oradora considerou que as Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) são por um lado uma consequência evolutiva das experiências passadas dos agrupamentos de proprietários florestais e se afiguram “ como um bom instrumento para atingir objectivos como a defesa da floresta contra incêndios, aumento da produção e certificação da gestão florestal sustentável, através da transferência e profissionalização da gestão para a entidade gestora da ZIF”.
Rosário Alves chamou ainda a atenção para a existência de uma fiscalidade desadequada ao sector que faz muitos agentes resvalarem para a informalidade.
A especialista criticou igualmente a forma com funciona o Fundo Florestal Permanente, pois muito deste tem sido utilizado para cumprir funções do próprio Estado quando deveria ser antes utilizado para se reforçar o investimento no sector.
É inaceitável que numa situação de crise como a actual se estejam a perder milhões euros que podiam entrar no país para ajudar o sector agrícola, o que poderia ser um escape para o que se está a passar nos restantes sectores da economia.